sexta-feira, 25 de março de 2011

DIVERSIDADE CULTURAL NO UNIVERSO INFANTIL

 

   
Imagine um lugar onde inclusão social e diversidade cultural se misturam ao universo infantil… difícil? Nem tanto, na loja Preta Pretinha, na Vila Madalena em São Paulo, é possível encontrar bonecas artesanais negras, orientais, indígenas, indianas, muçulmanas e até portadoras de deficiência física. Cada boneca é única e uma verdadeira obra de arte.
Um sonho que se tornou realidade…
A loja nasceu do sonho de infância de três irmãs: Joyce, Lúcia e Cristina. Joyce Venancio explica que, desde cedo, ela e as irmãs aprenderam o valor da auto-estima: ”minha avó passou para minha mãe, como para toda a família, a importância não só de ser negra, mas de como lidar com a diversidade”.  
Sendo assim, ela  nunca se conformou em não ter uma boneca negra, com a qual se identificasse para brincar. “Nas lojas só encontrava bonecas brancas e, principalmente, loiras”. Ao ver a decepção da neta, a avó Maria Francisca resolveu costurar  bonecas de pano com meia de seda e malhas na cor preta e marrom. Ela gostou tanto que aprendeu a fazer e,  anos depois, resolveu transformar o hobby familiar em negócio.
O cuidado de Joyce com as bonecas é tanto que ela se preocupa em escolher tecidos que tenham o tom correto da pele negra. Para ela, é preciso muita atenção para evitar estereótipos, já que as bonecas servem como um reflexo para as crianças. “Geralmente as bonecas negras vendidas no mercado são do tom preto, apresentam a boca muito grande, roupas espalhafatosas e jocosas, que não tem nada a ver com a nossa realidade”.
O folclore brasileiro também está presente. Com um boneco do Saci-Pererê nas mãos, Joyce surpreende ao contar uma outra história do menino de gorro vermelho: ”ele foi um líder negro que teve a perna amputada pelo ’senhor’, porque era um guerreiro que lutava por seus ideias. E, mesmo depois, de ser amputado, continuou como líder”.  Uma versão bem diferente da que acostumamos ouvir nas escolas!
“Diversidade é coisa séria”, esse é o lema de Joyce! Ao perceber a dificuldade dos profissionais e da própria sociedade em com a deficiência física, ela então resolveu ousar um pouco mais e criou os bonecos da inclusão. ”Eu tenho boneca de muleta, amputada e até uma que passou por quimioterapia”.
Nem as diferenças étnicas ficaram de fora. Oriental, mulçumana, judia, indiana, na loja tem de tudo. “Eu faço qualquer tipo de boneca que contribua como ferramenta para a educação”.  Até o universo GLBTS está representado: “os pais tem muita resistência em falar sobre a sexualidade com os filhos. Essas bonecas podem ajudá-los”.  
Cuidando do Planeta Terra – As aventuras de Preta Pretinha
Autor: Antonia Joyce Venancio
Editora: Scortecci
Páginas: 24
1ª Edição – 2008
O que começou com uma loja de bonecas, se transformou também em livro. Cuidando do planeta Terra- as aventuras de Preta Pretinha traz temas importantes para as crianças, como a reciclagem, indispensável para a preservação do meio ambiente.
Instituto Preta Pretinha 
Além da loja e do livro,  Joyce também criou um Instituto. ”Com o tempo, a loja passou a ser visitada por diversos profissionais como educadores, psicólogos, procuradores, fonoaudiólogos e juízes da vara da infância e da família. Notei a angústia, principalmente dos educadores, que precisam trabalhar a inclusão e diversidade nas escolas”. Hoje, ela dá palestras em escolas e empresas.  Joyce também procura o apoio de patrocinadores que queiram divulgar a idéia e, quem sabe, até ajudá-la a buscar um novo lugar para abrigar tanta diversidade.
Reportagem: Anapaula Ziglio

 Confira tudo isso em nosso passeio virtual:

quarta-feira, 23 de março de 2011

Como trabalhar as relações raciais na pré-escola

Mostrar a importância de respeitar as diferenças é uma lição que deve ser ensinada desde os primeiros anos de escolaridade

Débora Menezes

Toque no cabelo e a representação das sensações com massinha

Em Campinas, interior de São Paulo, a professora Elaine Cassan também usou histórias para dar uma abordagem pedagógica ao tema etnia na EMEI Iniciação Pezinhos Descalços. Tudo começou com uma brincadeira sutil: deixar as crianças experimentarem o toque, nos cabelos umas das outras, para perceber que nem todo mundo é igual.
Em seguida, elas representaram essas sensações em bonecos de massinha. "Tanto o toque como a massa de modelar têm o objetivo de experimentar um contato prazeroso com o outro", explica Elaine. No ano passado, a professora Renata Esmi Laureano deu continuidade ao trabalho, que incluiu a produção de um "álbum da diversidade", com desenhos e colagens de fotos e gravuras com pessoas de todos os jeitos e gêneros. Os pais também participaram, resgatando fotografias de antepassados para que as crianças pudessem fazer uma árvore genealógica, descobrindo sua identidade familiar. Tudo para valorizar a individualidade e a história de cada um.
Contos e filmes, como o desenho animado Kiriku e a Feiticeira, também foram mostrados para a garotada conhecer histórias de origem africana. As duas professoras compartilharam informações e reflexões com os colegas e promoveram até uma sessão só com intervalos de um canal de TV para as crianças mais velhas observarem os tipos físicos que aparecem nas propagandas. "Assim, pudemos reconhecer com eles as diferenças e abordar a questão do preconceito de forma crítica", lembra Renata.
Glossário
Antes de propor ações positivas para a questão racial, é importante entender o significado exato de três conceitos fundamentais para trabalhar corretamente o tema.
Preconceito
Alguém age com preconceito quando faz um prejulgamento ou tem uma ideia preconcebida, sem razão objetiva, a respeito de um indivíduo ou de um povo. É preconceituoso quem diz que "os negros (ou os índios) não gostam de estudar".

Discriminação
A discriminação ocorre quando os preconceitos são exteriorizados em atitudes ou ações que violam os direitos das pessoas com base em critérios injustos (que podem ser não só de raça mas de sexo, idade e religião, entre outros).

Racismo
O racismo é definido como "o comportamento hostil e de menosprezo em relação a pessoas cujas características intelectuais ou morais são consideradas inferiores por outros que se consideram superiores". Pesquisadores que estudam o assunto acreditam que o conceito atual de racismo surgiu no século 18 para justificar a dominação do branco europeu sobre os povos de outros continentes.

Fonte: Programa São Paulo - Educando pela Diferença para a Igualdade (Neab/UFSCar)

Sugestão de atividades para combater o preconceito
Lucimar Rosa Dias, especialista em Educação e relações raciais, doutoranda em Educação pela Universidade de São Paulo e membro da Comissão Técnica Nacional de Diversidade para Assuntos Relacionados à Educação dos Afro-Brasileiros, do Ministério da Educação, e Waldete Tristão Farias Oliveira, coordenadora pedagógica do Centro de Educação Infantil Jardim Panamericano e formadora de professores, sugerem as seguintes atividades para promover ações afirmativas e combater o preconceito e a discriminação em sala de aula.

RODAS DE CONVERSA

Reunir os pequenos em uma roda abre espaço para conhecê-los melhor. Para entender as relações de preconceito e identidade, vale a pena apresentar revistas, jornais e livros para que as crianças se reconheçam (ou não) no material exposto. A roda é o lugar de propor projetos, discutir problemas e encontrar soluções. Também é o melhor espaço para debater os conflitos gerados por preconceitos quando eles ocorrerem. Nessa hora, não tema a conversa franca e o diálogo aberto.

VÍDEOS E CONTOS

A contação de histórias merece lugar de destaque na sala de aula. Ela é o veículo com o qual as crianças podem entrar em contato com um universo de lendas e mitos e enriquecer o repertório. Textos e imagens que valorizam o respeito às diferenças são sempre muito bem-vindos.

BONECOS NEGROS

As crianças criam laços com esses brinquedos e se reconhecem. É interessante associar esses bonecos ao cotidiano da escola e das próprias crianças, que podem se revezar para levá-los para casa. A presença de bonecos negros é sinal de que a escola reconhece a diversidade da sociedade brasileira. Caso não encontre bonecos industrializados, uma boa saída é confeccioná-los com a ajuda de familiares.

TOQUE

Mexer nos cabelos e trocar pequenos carinhos é uma forma de cuidar das crianças e romper possíveis barreiras de preconceitos. O trabalho com o cabelo abre caminho para estudar tamanho, textura, cor e permite aprender que não existe cabelo ruim, só estilos diferentes.

COMIDA

Pesquisar a história de alimentos de origem africana é um jeito de valorizar a cultura dos afro-descendentes. Melhor ainda se houver degustação, com o apoio da comunidade. As aulas de culinária são momentos ricos para enfocar as heranças culturais dos vários grupos que compõem a sociedade brasileira.

MÚSICA E ARTES PLÁSTICAS

A música desenvolve o senso crítico e prepara as crianças para outras atividades. Conhecer músicas em diferentes línguas, e de diferentes origens, é um bom caminho para estimular o respeito pelos diversos grupos humanos. E isso se aplica a todas as formas de Arte.
Formação para atender à Lei 10.639, de 2003

A questão racial é conteúdo obrigatório no currículo escolar. A Lei 10.639, de 2003, decretou a inclusão do ensino da História e da cultura afro-brasileiras no Ensino Fundamental e Médio. E a lei passou a valer para todos os níveis da Educação Básica com a instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais.
Para ajudar escolas e professores, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação promove cursos de capacitação e distribui material didático sobre o tema. Um desses cursos, em parceria com a Universidade de Brasília, já formou (a distância) cerca de 25 mil professores de escolas públicas de 306 municípios de todo o país no tema Educação e Diversidade Étnico-Raciais.
Além de conhecer a influência africana na formação cultural brasileira, eles receberam informações sobre a questão racial na Educação Infantil, principalmente no que diz respeito à identidade racial.
Os especialistas ressaltam que o objetivo do professor não deve ser desprezar um determinado tipo de cultura ou dizer que uma é melhor do que outra. "Cabe à escola dar oportunidade para todos conhecerem a cultura afro e entenderem que ela faz parte da cultura brasileira", diz Waldete Tristão Farias Oliveira, coordenadora pedagógica do Centro de Educação Infantil Jardim Panamericano e formadora de professores em questões raciais.
Projetos contra o preconceito...
- Valorizam quem se sente menosprezado.
- Estimulam o respeito à diversidade.
- Formam cidadãos preocupados com acoletividade.

Quer saber mais?
Centro Municipal de Educação Infantil Creche Vovô Zezinho, R. do Comércio, s/no, 40010-000, Salvador, BA , tel. (71) 3611-7353
EMEI Iniciação/Pezinhos Descalços, R. José Jorge Filho, 90, 03101-048, Campinas, SP , tel. (19) 3253-6118

INTERNET

Endereço eletrônico do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab) e traz apostilas do Programa São Paulo - Educando pela Diferença para a Igualdade, com diversas sugestões de atividades para sala de aula

Site do
Centro de Estudos das Relações do Trabalho e da Desigualdade, que produz material didático e de apoio para professores trabalharem a questão racial

BIBLIOGRAFIA

Aguemon
, Carolina Cunha, 54 págs., Ed. Martins Fontes, tel. (11) 3241-3677, 30 reais
As Tranças de Bintou, Sylviane Diouf, 32 págs,. Ed. Cosac Naify, tel. (11) 3823-6590, 31 reais
Bruna e a Galinha d'Angola, Gercilga de Almeida, 24 págs., Ed. Pallas, tel. (21) 2270-0186, 21 reais
Educação como Prática da Diferença, Anete Abramowicz, Lucia Maria de Assunção Barbosa e Valter Roberto Silvério, 184 págs., Armazém do Ipê, tel. (19) 3289-5930, 33 reais
Irê Ayô: Mitos Afro-brasileiros, Vanda Machado e Carlos Petrovich, 123 págs., EDUFBA, tel. (71) 3263-6164, 20 reais
Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais, org. Ministério da Educação/Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 264 págs., tel. (61) 2104-6183 (distribuição gratuita para escolas)
Trabalhando a Diferença na Educação Infantil, Anete Abramowicz, Valter Roberto Silvério, Fabiana de Oliveira e Gabriela Guarnieri de Campos Tebet, 127 págs., Ed. Moderna, tel. 0800-17-2002, 23,50 reais
Tramas da Cor - Enfrentando o Preconceito no Dia-a-Dia Escolar, Rachel de Oliveira, 121 págs., Ed. Selo Negro/Edições Summus, tel. (11) 3865-9890, 22 reais
Xangô, o Trovão, Reginaldo Prandi, 64 págs., Ed. Cia. das Letrinhas, tel. (11) 3707-3500, 30,50 reais

segunda-feira, 21 de março de 2011

VIVENCIANDO UM POUCO DA DIVERSIDADE

Uma de nossas funções como educadoras é valorizar e respeitar a diversidade, para que isso realmente ocorra, “...temos que assumir um trabalho de acolhimento às diferentes expressões e manifestações das crianças e suas famílias...” (RCNEI, vol. 1, p.77) somente assim conseguiremos proporcionar uma educação verdadeiramente inclusiva. Diante desse contexto apresentaremos algumas sugestões de atividades que proporcionam a vivencia diversidade cultural em nosso espaço escolar:

RODAS DE CONVERSA:
Momento em que o diálogo e o intercambio de idéias, possibilitam que as crianças ampliem suas capacidades comunicativas, podendo fazer uso de um disparador como: fotos, filmes, comidas, textos de diferentes gêneros, etc.

Leitura:

Menina bonita do laço de fita, Ana Maria Machado,  Àtica
A cor da ternura, Geni Guimarães,  FTD
A menina que tinha um céu na boca, Júlio Emílio Braz, DCL
Adamastor, o pangaré, Marianna Massarani, Melhoramentos,
Betina, Nilma Lino Gomes, Mazza Edições
Bruna e a galinha d´Angola, Gercilga de Almeida, Pallas
Histórias da Preta, Heloisa Pires Lima,  Cia das Letrinhas
Ifá, o advinho,  Reginaldo Prandi, Cia das Letrinhas
Menino parafuso,  Ângelo Abu, Autêntica

Minhas contas,  Luiz Antônio, Cosac Naif
O chamado de Sosu, Meshack Asare, Edições SM

O comedor de nuvens, Heloisa Pires Lima, Paulinas

O menino Nito,  Sonia Rosa.Pallas

O Pássaro-da-Chuva, Kersti Chaplet, Ed. Ática
O super-herói e a fralda, Heloisa Prieto,  Ed. Ática
Obax,  André Neves, Brinque-book
Omo-Oba: histórias de princesas, Kiusam Oliveira, Mazza Edições
Princesa Arabela: mimada que só ela, Milo Freeman,  Ática
Uma idéia luminosa, Rogério Andrade Barbosa, Pallas

Contos Aficanos, Rogério Andrade Barbosa, Pallas

História da África, Gcina Mhlophe, Pallas


Vídeo:

Kirakuru (http://www.youtube.com/watch?v=gxUiV9-R26k)
Diversidade étnica (http://www.youtube.com/watch?v=iULhMHfudTE&feature=fvw)
Cultura afro brasileira (http://www.youtube.com/watch?v=8S_QC6ETINk)
Cultura africana (
http://www.youtube.com/watch?v=KTd9IlROM-U&feature=related)
Somos todos iguais (http://www.youtube.com/watch?v=WWk8MJ-7nmE&feature=related)

Boneca(o) de pano:
Momento em que as crianças juntamente com o educador constroem o boneco(a) que será compartilhado com a família, possibilitando a inserção de vestimentas e adereços, podendo ser acompanhado um diário em que será descrito a sua vivência naquela residência.


Artes:
África na Arte - diversidade cultural: tradições e costumes, retratados na arte plástica dos Pintores: Anthony Ross, Isabella Vital, Jacques Beaumont, Marso Savaro, Ivey Haies, Keith Mallet.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Vídeo: VISTA MINHA PELE (01 de 03)

Educação não tem cor

Com discussões e projetos bem elaborados, é possível combater o preconceito racial que existe, sim, na escola. Está nas suas mãos, professor, o sucesso dessas crianças, negras e brancas, como alunas e cidadãs

Roberta Bencini
A aluna Roseane queria ter os cabelos
trançados como os da colega Juliana:
ampliação dos padrões de beleza.

Foto: Ricardo B. Labastier/ Sorvo
Roseane Souza de Queirós, 8 anos, tem os cabelos lisos e claros, mas queria que eles fossem trançados e escuros como os da colega de sala de aula Juliana Francisca de Souza Claudino, uma garota negra também de 8 anos. Um dia, apareceu com o mesmo penteado afro. A atitude de Roseane surpreende. É muito, muito mais comum a criança negra desejar se parecer com a maioria dos heróis dos contos de fadas europeus, com as modelos estampadas em revistas e jornais e com os colegas que recebem maior atenção em sala, todos brancos e loiros. As duas meninas participam sistematicamente de discussões e projetos anti-racistas na Escola Classe 16, no Gama (DF). O desejo de Roseane é um exemplo concreto de que é possível combater na escola preconceitos e estereótipos enraizados.
E prova, de acordo com especialistas, que uma das saídas para o fim das desigualdades educacionais do Brasil está em enfrentar as desigualdades raciais que estão presentes, sim, no ambiente escolar. Quer ver como? A começar pelo currículo. A história e a cultura negras têm pouco ou nenhum destaque, diferentemente da cultura européia. Em um país com 44% de população afro-descendente, quantas pessoas conhecem a rainha Nzinga, líder da libertação do reino africano Ndongo em 1660, ou Dandara, guerreira do Quilombo dos Palmares, ao lado de Zumbi?


Outro dado: a participação das crianças negras na última série do Ensino Médio representa a metade da registrada na 4ª série. Já os brancos somam 44% dos alunos da 4ª série, mas totalizam 76% na 3ª série do Ensino Médio. Mais: a escolaridade média de um negro com 25 anos gira em torno de 6,1 anos. Um branco da mesma idade tem cerca de 8,4 anos de estudo. Dessa maneira, é possível concluir que crianças negras, como Juliana, enfrentam muitos obstáculos para permanecer na escola. E, sem dúvida, está nas mãos dos professores o futuro delas como alunas e cidadãs, defensoras de seus direitos.


Portanto, eis uma demanda urgente para você: ampliar a discussão e os projetos pedagógicos que privilegiem a igualdade racial. Desde maio, com a aprovação da Lei nº 10.639, é obrigatório o ensino de história da África e da cultura afro-brasileira em todas as escolas de Ensino Fundamental e Médio. Para ajudá-lo a se adequar, mostramos os principais erros e acertos sobre as questões raciais e projetos pedagógicos que valem como inspiração para trabalhar o assunto em novembro, mês de comemoração da consciência negra, e durante o ano todo.


Passado e presente de discriminação


Uma boa medida para entender o impacto do preconceito e da discriminação na vida escolar é analisar a biografia de professores negros. Quem é a professora de Juliana e Roseane, que conseguiu ampliar padrões de beleza na sala de aula?


Marizeth Ribeiro da Costa de Miranda, 39 anos, escolheu a profissão movida por suas experiências pessoais de racismo na escola e fora dela. Dois momentos são extremamente marcantes na trajetória de estudante de Marizeth: um passeio de coleira pelos corredores da escola (um colega quis reproduzir uma imagem de escravos mostrada no livro de História) e o tapa que levou de uma professora, quando conversava com uma colega branca na sala de aula. Somente Marizeth foi repreendida. "Precisei de muita força para não desistir dos estudos. Mas segui minha vida escolar calada", afirma.


O silêncio é uma constante nas relações raciais. De forma consciente, como fez Marizeth, ou inconsciente, como agem os que não sabem lidar com o assunto. Desse modo, tornou-se natural tratar a história do negro apenas na perspectiva da escravidão e aceitar padrões estéticos e culturais de uma suposta superioridade branca. Sobre isso, disse o líder negro americano Martin Luther King (1929-1968): "Temos de nos arrepender nessa geração não tanto pelas más ações das pessoas más, mas pelo silêncio assustador das pessoas boas".
O relato de vida de professores negros foi tema de um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais. As histórias que fazem parte da pesquisa se confundem em muitos pontos. Apelidos, xingamentos e discriminações são experiências vividas por todos os entrevistados. "Todos deixaram por algum período a escola, seja por problemas financeiros, seja por falta de motivação. As singularidades estão expressas na forma como cada um reagiu ao preconceito e à discriminação racial e nos processos pelos quais, gradativamente, chegaram a perceber a condição do negro no Brasil", conta Patrícia Santana, professora responsável pela pesquisa.
A cultura negra em sala de aula
ERROS


- Abordar a história dos negros a partir da escravidão.


- Apresentar o continente africano cheio de estereótipos, como o exotismo dos animais selvagens, a miséria e as doenças, como a aids.


- Pensar que o trabalho sobre a questão racial deve ser feito somente por professores negros para alunos negros.


- Acreditar no mito da democracia racial.
ACERTOS


- Aprofundar-se nas causas e consequências da dispersão dos africanos pelo mundo e abordar a história da África antes da escravidão.


- Enfocar as contribuições dos africanos para o desenvolvimento da humanidade e as figuras ilustres que se destacaram nas lutas em favor do povo negro.


- A questão racial é assunto de todos e deve ser conduzida para a reeducação das relações entre descendentes de africanos, de europeus e de outros povos.


- Reconhecer a existência do racismo no Brasil e a necessidade de valorização e respeito aos negros e à cultura africana.
 Na infância, parece que somos iguais 


A história de Creuza Maria de Souza Yamamoto, professora da rede municipal de São Paulo, comprova os resultados da dissertação. Ela só se deu conta do racismo na vida adulta. "Na infância, parece que somos todos iguais e eu tentava me enxergar como meus colegas brancos. Mas minha cor era sempre motivo de piadas", lembra. Atenção e carinho dos professores não fazem parte das lembranças de Creuza. Ela ouviu mais de uma vez frases do tipo: "Ah... esses alunos são burros. Não dá para esperar muito deles". Adulta, optou pelo magistério e, na sala dos professores, o preconceito permanecia o mesmo. "No auge de uma discussão com uma colega, ouvi que meu lugar era na cozinha e não em sala de aula", conta. Creuza era a única professora negra da escola. Hoje, em outra escola, a primeira atividade que faz ao assumir uma turma nova é medir a intensidade do preconceito em seus alunos. Bonecas negras e brancas são colocadas no centro da sala de aula para chamar a atenção das crianças. "Infelizmente, quase sempre as bonecas negras são ignoradas, até mesmo pelos alunos negros."


Relação melhora com discussões


A escolarização significou para Marizeth, Creuza e os personagens ouvidos por Patrícia Santana uma possibilidade de ascensão social. E se tornar professor, além de ser um caminho para a melhoria de vida, foi uma escolha política. "Eu não quero que meus alunos negros sofram o tanto que eu sofri", afirma Marizeth. Assim, sempre que possível, elabora projetos pedagógicos e lança discussões sobre as relações raciais em sala de aula. O trabalho tem dado resultado. A relação entre os alunos negros e brancos está melhor e com a valorização da cultura negra, agora Juliana sabe que pode ficar bonita com suas tranças, diferentemente do que acontecia com a menina Marizeth. "E pensar que eu tinha a cabeça cheia de feridas por causa do creme que meu pai aplicava para alisar meus cabelos", lembra, emocionada. Esses exemplos valem uma reflexão: com quantas situações de preconceito e discriminação você depara todos os dias?


Lei institui valorização da África


Da geração das professoras Marizeth e Creuza à de Juliana e Roseane, os negros alcançaram importantes conquistas na educação. E somente agora há sinais concretos de mudanças para o futuro nas relações inter-raciais. Primeiro foram os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que orientam a promoção da igualdade em um dos temas transversais, Pluralidade Cultural. Mas um passo muito maior e mais significativo para o ensino foi dado com a Lei no 10.639. "A legislação rompe com a ordem dos currículos ao propor um novo conhecimento científico contrário à superioridade da produção cultural europeia", afirma Eliane Cavalleiro, pedagoga e coordenadora-geral de Diversidade e Inclusão Educacional do Ministério da Educacão (MEC). Ou seja, o mundo não se resume às conquistas e derrotas do continente europeu.


O documento determina que a história da África seja tratada em perspectiva positiva, não privilegiando somente as denúncias da miséria que atinge o continente. A importância dos anciãos na preservação da memória e a religiosidade, por exemplo, passam a fazer parte dos conteúdos, assim como o conhecimento da contribuição dos egípcios para o desenvolvimento da humanidade. As marcas da cultura de raiz africana devem ser ressaltadas particularmente em Artes, Literatura e História do Brasil. E mais. Os professores precisam valorizar a identidade negra e ser capacitados para destruir o mito da democracia racial no Brasil, criado durante o regime militar (1964-1985). "Quem estudou nas décadas de 1970 e 1980 aprendeu nos livros que o apartheid era um fenômeno de segregação racial restrito à África do Sul e que no Brasil não existia racismo. Não podemos mais acreditar nisso", afirma Cidinha da Silva, historiadora e presidente do Instituto da Mulher Negra (Geledés), de São Paulo.


Pesquisas e música afro 


A lei só sairá do papel se você tiver acesso a material e formação sobre a temática racial na educação. Portanto, agora é hora de buscar bibliografia sobre o assunto, eleger o tema para discussão em grupos de estudos e fomentar a criação de cursos em sua escola e cidade sobre educação anti-racista.


A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo distribuiu 58 mil livros de literatura e de formação para a maioria das escolas da cidade. Foi lançado um kit com 40 títulos que valorizam a cultura e a identidade negra, como Menina do Laço de Fita, de Ana Maria Machado, e Felicidade Não Tem Cor, de Júlio Emílio Braz. O pacote inclui capacitação a 3 mil coordenadores das salas de leituras de escolas paulistanas. "Nossa opção de promover uma prática de igualdade racial parte de uma bibliografia. Esse é apenas um caminho", afirma Marilândia Frazão, assessora de assuntos de política pública e ações afirmativas da secretaria de Educacão de São Paulo.


Algumas cidades têm trabalhos na mesma linha e o resultado aparece nos projetos que começam a pipocar. O professor de História Eduardo Benedito Leite de Almeida, da Escola Municipal de Ensino Fundamental Dr. João Alves dos Santos, em Campinas (SP), explorou a pesquisa científica com turmas de 7ª série em um trabalho interdisciplinar. Entrevistas, questionários, leitura de livros, revistas e jornais, seminários, confecção de cartazes, desenhos, charges e histórias em quadrinhos ocuparam os alunos por todo o ano letivo. Os temas eram variados, mas todos ligados às relações inter-raciais. Um grupo de alunos pesquisou com moradores da comunidade ao redor da escola se existia racismo no Brasil, outro registrou tudo sobre as festas religiosas africanas e um terceiro conheceu manifestações folclóricas, como a congada.


Leitura e interpretação de indicadores sociais sobre a população negra foram feitas nas aulas de Matemática. Um dos objetivos do projeto era a produção de material de pesquisa. Assim, tudo era registrado em vídeo, fotografias ou artigos publicados no jornal da escola, como a oficina de maracatu. Nessa etapa, o professor contou com a participação de um grupo do movimento negro, que ensinou aos alunos a importância das batidas e dos significados desse ritmo africano. Uma das orientações da Lei nº 10.639 é contar com os membros do movimento negro para elaborar projetos pedagógicos. "O trabalho ainda não acabou, mas já é possível perceber mudanças significativas no tratamento entre os alunos e no interesse pelas coisas da África", conta Eduardo.


O projeto foi um dos vencedores do prêmio Educar para a Igualdade Racial, promovido pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), de São Paulo. Uma ótima fonte de experiências sobre combate ao racismo nas escolas. "O próximo passo é estabelecer indicadores de uma boa prática em classe. Ainda há disparidade entre o discurso de reconhecimento do racismo e as atividades pedagógicas", diz Isabel Aparecida dos Santos, assessora pedagógica do Ceert.


A identidade da criança negra 


O trabalho de educação anti-racista deve começar cedo. Na Educação Infantil, o primeiro desafio é o entendimento da identidade. A criança negra precisa se ver como negra, aprender a respeitar a imagem que tem de si e ter modelos que confirmem essa expectativa. Por isso, deve ser cuidadosa a seleção de livros didáticos e de literatura que tenham famílias negras bem-sucedidas, por exemplo, e heróis e heroínas negras. Se a linguagem do corpo é especialmente destacada nas séries iniciais, por que não apresentar danças africanas, jogos como capoeira, e músicas, como samba e maracatu?


Em Artes, a professora Simone Marambaia Lins de Carvalho, da Escola Fundação Bradesco, no Rio de Janeiro, trabalhou máscaras africanas com turmas de 1ª série. Um dos eixos do projeto Ser Negro, sem Preconceito era desmitificar estereótipos da África. Os alunos pesquisaram curiosidades do continente africano até chegar à arte, como a cultura de Benim, na Nigéria, produtora de máscaras religiosas. Papelão, tinta e cola renderam modelos coloridos e divertidos para afastar os maus espíritos. Para a compreensão da realidade atual do negro no Brasil, a turma conheceu como era o cotidiano das crianças na época da escravidão, analisando imagens. As obras de Jean-Baptiste Debret (1768-1848), que foram comparadas às fotografias publicadas em jornais atuais, dão um panorama crítico da situação do passado e do presente. "Ainda há muito sofrimento e violência contra a criança negra, mas o contraponto do projeto estava na alegria e na majestade da cultura africana", explica a professora. Tudo como deve ser. Sem constrangimentos nem mitos equivocados.
Um histórico das lutas e conquistas recentes


A ciência dos séculos 18 e 19 considerava que os brancos possuíam maior capacidade intelectual. Depois vinham os índios e, por último, os negros. Alguns estudos afirmavam que os negros se situavam abaixo dos macacos. "Qualquer que seja o grau dos talentos dos negros, ele não é a medida dos seus direitos", Thomas Jefferson (1743-1826), político americano.


1948 - Uma das mais significativas experiências de mobilização negra foi o jornal Quilombo, editado no Rio de Janeiro. A edição nº 0, ano 1, trazia a seguinte afirmação: "Nos dias de hoje a pressão contra a educação do negro afroxou (sic) consideravelmente, mas convenhamos que ainda se acha muito longe do ideal".


1949 - 1º Congresso do Negro Brasileiro. Temas abordados: sobrevivências religiosas e folclóricas; formas de luta (capoeira de Angola, batuque, pernada); línguas (nagô, gegê, língua de Angola e do Congo, as línguas faladas nos anos de escravidão).


Década de 1950 - Iniciam-se os primeiros estudos sobre preconceitos e estereótipos raciais em livros didáticos no Brasil.


Décadas de 1960 e 1970 - Os militares oficializaram a ideologia da democracia racial e a militância que ousou desafiar esse mito foi acusada de imitadora dos ativistas americanos, que lutavam pelos direitos civis. O mito da democracia racial persiste até hoje.


Década de 1980 - Retomada dos estudos sobre preconceitos e estereótipos raciais em livros didáticos. Os resultados das pesquisas apresentam a depreciação de personagens negros, associada a uma valorização dos brancos.


1984 - Em São Paulo, a Comissão de Educação do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e o Grupo de Trabalho para Assuntos Afro-Brasileiros promoveu discussões com professores de várias áreas sobre a necessidade de rever o currículo e introduzir conteúdos não discriminatórios.


1985 - A comemoração de 13 de maio foi questionada pela Comissão por meio de cartazes enviados às escolas do estado de São Paulo. O material também exaltava 20 de novembro como data a comemorar a consciência negra.


1986 - A Bahia inseriu a disciplina Introdução aos Estudos Africanos nos cursos de Ensino Fundamental e Médio de algumas escolas estaduais atendendo a antiga reivindicação do movimento negro.


1996 - Entre os critérios de avaliação dos livros didáticos comprados e distribuídos pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) foram incluídos aqueles específicos sobre questões raciais.


1998 - Inclusão da Pluralidade Cultural entre os temas transversais nos Parâmetros Curriculares Nacionais.


2003 - A publicação da Lei no10.639 tornou obrigatório o ensino da História da África e dos Afro-brasileiros no Ensino Fundamental e Médio.


Fonte: estudos e pesquisas de Benilda Regina Paiva de Brito e Fúlvia Rosemberg
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Contatos
Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), R. Duarte de Azevedo, 737, 02036-022, São Paulo, SP, tel. (11) 6978-8333, internet: http://www.ceert.org.br/


Escola Classe 16, Q 06 área especial, setor Sul, 72415-060, Gama, DF, tel. (61)556-2553


Escola Municipal de Ensino Fundamental Dr. João Alves dos Santos, Estr. dos Amarais, 635, 13067-170, Campinas, SP, tel. (19) 3281-2694


Fundação Bradesco, R. Haddock Lobo, 253, 20260-131, Rio de Janeiro, RJ, tel. (21) 2503-1664


Bibliografia
Almanaque Pedagógico Afrobrasileiro
, Rosa Margarida de Carvalho Rocha, 167 págs., Ed. Mazza, tel. (31) 3481-0591, 29 reais

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/legislacao/educacao-nao-tem-cor-425486.shtml

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.639.htm

CURRÍCULO X IDENTIDADE CULTURAL

No ano de 2003, foi lançada a lei federal nº 10.639, que modificou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de cultura africana e afro-brasileira nas escolas de todos os estados brasileiros com o intuito de diminuir a discriminação em nosso país. Mas, infelizmente ainda deparamos em nosso cotidiano, com um currículo feito para alunos “ideais”, que desconsidera a sua diversidade sócio-cultural. Diante desse, contexto a escola desconsidera que as nossas raízes que estão no povo africano que foi iniciado com a sua chegada, impossibilitando assim a construção do que hoje chamamos de identidade cultural afro-brasileira.
Segundo Fonseca (2010), as relações étnico-raciais ainda somente é marcada em datas especificas, apesar de serem garantida por lei e por fazerem parte de nossa história. História essa que somente possibilita a discriminação, preconceito, marginalização e o racismo. Afinal, ainda fomentamos a ideologia apresentados nos livros didáticos, ao invés de estabelecer uma relação política com aqueles que o manipulam e realmente posicionar a identidade étnico racial como parte integrante de nossa história.
Além disso, a identidade é assegurada nos princípios do ensino propostos pelo artigo 206 da Constituição Federal de 1988. Portanto, devemos promover uma escola democrática que humanize e assegure a aprendizagem, considerando o desenvolvimento de seus alunos, interesses, necessidades, potencialidades, conhecimentos e sua cultura.
Diante desse contexto, é nosso dever como educadores considerar e resgatar a identidade cultural afro-brasileira, afinal a influência da História Cultural da África é muito nítida na cultura de nosso país.